RESUMO
A
implantação de espaços para a organização de bibliotecas em escolas municipais,
a ampliação de acervos, atreladas a um trabalho de formação de professores para
a dinamização destes espaços, foi possível através do Programa Bibliotecas
Escolares da Secretaria Municipal de Educação de Campinas, desenvolvido de 1993 a 2000. A partir de 2001 o
Programa assumiu outro formato, permanecendo os espaços e a manutenção do
pagamento de professores para organizá-los e dinamizá-los. Sem o assessoramento
específico, anteriormente oferecido aos professores e escolas, as parcerias com
empresas e o apoio de outras instituições, alguns espaços se perderam ou se
descaracterizaram; parte dos professores que já desenvolviam o trabalho nas
bibliotecas abandonou o trabalho, novos professores assumiram esta função,
mesmo sem a formação específica e outros ainda procuraram se adequar às novas
condições, utilizando-se da formação adquirida no passado, quando eram
assessorados por uma equipe da própria Secretaria de Educação do município. O
objetivo deste trabalho é divulgar o projeto de uma escola que assumiu essa
característica, a EMEI “Reino Encantado”, que além de dar continuidade ao
trabalho de leitura proposto anteriormente, integrou-o ao trabalho de
Arte-Educação, iniciado efetivamente em 2003, incorporando os dois projetos ao
Projeto Pedagógico da Escola. Esta integração objetiva enriquecer a prática
pedagógica, articulando literatura, obras e artistas aos temas e assuntos
integrantes do planejamento, ampliar a leitura e a cultura de professores,
alunos e, também, da comunidade, contribuir para a sensibilização, para o
desenvolvimento da auto-estima dos alunos, da expressão criativa de todos os
envolvidos e servir como referência para novas criações. Apesar de a Biblioteca ainda não possuir um
espaço próprio, mesmo depois de inúmeras solicitações, ocupando boa parte do
refeitório desde 1994, a
equipe de professores mantém um planejamento de ampliação do acervo, realizando pesquisas para a seleção e
aquisição de novos títulos; o acervo literário dá suporte para o
desenvolvimento do projeto pedagógico, fornecendo os títulos que auxiliam,
fundamentam e/ou ilustram os temas desenvolvidos, envolvendo os profissionais e as famílias dos alunos na
dinamização dos livros de literatura infantil. Já a arte, uma das mais antigas
linguagens humanas, tem uma importância que se encerra em si mesma, pois é
inclusiva por si só; é integração, pois permite mesclar temas e assuntos de
várias áreas ou disciplinas - independente de estar em alguns momentos a
serviço delas -, mas precisa ser construída, reconstruída e apropriada pelas
pessoas. Um dos espaços mais democráticos para se ter acesso a este patrimônio
é a escola, onde, na maioria das vezes, a arte é relegada a segundo plano,
apesar da necessidade de a formação do indivíduo ser integral. O interesse dos
alunos pelos conteúdos programados, a partir do trabalho integrado entre
literatura infantil e arte, demonstra crescimento, pois os temas se identificam
com suas experiências e conhecimentos trazidos para a escola e,
conseqüentemente, as atividades se tornam mais significativas.
I- INTRODUÇÃO: DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO ANTERIOR À EXPERIÊNCIA
A)
O Conflito Gerando Mudança:
Trabalhando
na área de educação infantil desde 1994 e, portanto, há dez anos, comecei a me
incomodar com a utilização quase freqüente, de cópias via xerox para o
desenvolvimento das atividades relacionadas com os conteúdos trabalhados. A
sensação que eu tinha era de que estas atividades praticamente prontas,
forçavam uma “motivação” e que o interesse dos alunos pelos temas não era
suficiente para que a aprendizagem ocorresse de forma significativa. A
motivação das crianças diante das atividades lúdicas se diferenciava demais da
motivação em relação às atividades que exigiam uma sistematização através de
desenho, pesquisa, recorte, colagem, escrita espontânea.
B)
O Suporte Pedagógico através dos Livros:
Os
livros de literatura sempre estiveram presentes na sala de aula e, enquanto
monitora ou coordenadora do Programa Bibliotecas Escolares, ampliei
significativamente meu conhecimento sobre o tema leitura e biblioteca escolar.
A
equipe responsável por esse programa da Secretaria Municipal de Educação de
Campinas, da qual fiz parte, coordenou os trabalhos de 1994 até 2000,
assessorando, aproximadamente 600 professores de 120 escolas de educação
infantil e fundamental, na organização de bibliotecas e no trabalho de
dinamização da leitura, produzindo material de leitura e pesquisa, organizando
atividades e eventos como palestras, oficinas, campanhas de arrecadação de
livros de literatura e concursos literários para professores e alunos (em
parceria com empresas e shoppings e com apoio de jornais locais), participando
de congressos e seminários e realizando mostras de trabalhos durante este
período. O objetivo geral do programa era ampliar o conceito de biblioteca
escolar, dinamizando e incentivando a leitura de informação, pesquisa e lazer.
Meus
critérios para seleção dos livros foram se modificando ao longo desse período,
diante da quantidade de lançamentos de pouca qualidade, com os quais me
deparava, tanto em relação aos textos quanto à ilustração, e também diante dos
lançamentos de muita qualidade. Muitos títulos objetivam apenas dar um suporte
pedagógico ao professor e essa não é a característica mais importante de um
livro de literatura infantil; ele precisa fazer algum sentido para o leitor,
ter relação com algo que faça parte de sua vida: sentimentos, acontecimentos,
reflexões, desejos, dúvidas ou simplesmente pelo texto gostoso de se ouvir (ou
ler) ou pela ilustração que enche os olhos de tanta beleza. Pode provocar o
aluno para que se expresse, socialize suas reflexões ou se cale; queira
representar seu pensamento utilizando papel, giz, lápis ou não. Na minha
opinião, não convém atrelar a leitura do livro com a representação da história
através de desenho, com muita freqüência, pois a repetição excessiva da
atividade causa a sensação de obrigatoriedade e desinteresse.
Uma
das atividades básicas que a biblioteca mantém é o empréstimo de livros,
semanalmente, para alunos e familiares. A criança escolhe o livro que levará
para casa, onde os pais, irmãos mais velhos ou avós poderão ler para ela,
quantas vezes quiser, durante o fim de semana. Às vezes, na escolha seguinte, a
criança pega o mesmo livro ou o indica para o colega. No retorno à aula, na
segunda-feira, as crianças que quiserem podem trocar suas impressões sobre o
livro lido, contar a história que leram, qual a parte que mais gostaram etc.
Outra atividade básica é o Mural de Leitura da Família, que é pendurado na
cerca da escola todos os dias e tem seus textos trocados semanalmente. São
crônicas, poesias, charges, curiosidades, temas de interesse público, etc.
C)
O Suporte da Formação Artística:
Como
também dei aulas de violão durante vinte anos e participei de vários cursos de
desenho e pintura, levava o violão uma vez por semana, para tocar e cantar com
os alunos das duas classes do período da manhã, no qual leciono e, aos poucos,
iniciar as crianças no trabalho da bandinha.
D)
A Valorização das Produções dos Alunos:
Em
relação às representações gráficas, sempre procurei valorizar as criações e
produções individuais dos alunos, mostrando que cada trabalho mostra um pouco
do que conhecemos e do que somos e, por isso, temos que fazê-los com carinho e
capricho e cuidar para que não estraguem ou se pecam, principalmente quando
levados para casa. O trabalho com os pais, em relação ao respeito pelas
produções das crianças, também tem sido freqüente, principalmente nas reuniões
bimestrais.
Em
1995 a
Secretaria de Educação comprou aproximadamente 100 livros para cada escola que
participava do Projeto Biblioteca, antigo nome do Programa Bibliotecas
Escolares. Os títulos foram selecionados com muito critério, seguindo sugestões
de listagens de premiados. Foi então que
as escolas receberam cerca de 10 livros da Coleção Crianças Famosas, da
editora Callis. Eram livros biográficos de compositores e pintores famosos,
desde a infância até começarem a se destacar nos estudos. Em minha escola e,
com certeza na maioria das demais escolas que receberam a coleção, as histórias
não eram muito lidas para as crianças, por causa da extensão do texto; os
livros eram mais utilizados para empréstimo. Precisavam ser melhor
aproveitados, mas sem outro recurso que os completasse não se tinha idéia de
como fazê-lo.
Em
função de minha relação com a literatura infantil, a música e as artes
plásticas (parte em função da formação e vida profissional e parte em função do
interesse e oportunidades da vida pessoal), propus-me a estudar e envolver os
demais professores da escola em meu processo de busca por um trabalho mais
significativo e menos “xerocopiado”. Para isso, propus um grupo de formação em
arte-educação, que acabou envolvendo mais três escolas municipais de educação
infantil vizinhas, com boa participação das professoras e também de monitoras
de creche.
II-CONTEXTUALIZAÇÃO DA EXPERIÊNCIA
Na Emei Reino Encantado, no Pq Fazendinha, a renda familiar das crianças é baixa, embora a maioria dos pais (pelo menos um do casal) estejam empregados. Existe uma estruturação familiar, na maior parte dos casos. Das 112 crianças da escola, consta que apenas duas estudam um instrumento musical e tem pais músicos. A grande maioria dos alunos somente tem acesso a livros de literatura, vai ao cinema, ao teatro e a passeios através da escola. Nos fins de semana a maioria das famílias costumam ficar em casa, visitar algum parente e ou passear num shopping. Assistem com bastante freqüência a programas de TV aberta. Apesar dos nossos esforços e estratégias é bastante difícil atrair os pais para o acervo de literatura, apropriada aos adultos, à disposição na nossa Biblioteca.
III- A EXPERIÊNCIA: FORMAÇÃO E ATUAÇÃO EM ARTE-EDUCAÇÃO
Formou-se
em agosto de 2003 um grupo com onze professoras e uma monitora, todas atuando
em 4 escolas municipais de educação infantil próximas, nos bairros Santa
Bárbara, São Jorge e Fazendinha, na região Norte de Campinas, com o propósito
de estudar, planejar e realizar conjuntamente trabalhos que integrassem
literatura, música, artes plásticas e outras manifestações ao planejamento
pedagógico das escolas e seus temas, como também a comunidade de pais das
crianças pertencentes à escola.
Assumi,
com o apoio formal da Secretaria Municipal da Educação, a coordenação do
trabalho e do grupo, que no início se reunia quinzenalmente na Emei Reino
Encantado, escola em que atuo. Neste ano de 2004, o grupo passou a se reunir
semanalmente e conta com a participação de dez professoras e duas monitoras.
Foram
estabelecidos os seguintes objetivos para o trabalho:
O TRABALHO COM AS EDUCADORAS
-Fundamentar os educadores para a prática;
-Conhecer
o acervo de livros existente em suas escolas, assim como os lançamentos;
-Estudar
a História da Arte: conhecer aquilo que foi construído pela humanidade, desde a
arte da pré-história até o contemporâneo;
-Conhecer
artistas e refletir sobre as diversas formas de expressão artística: desenho,
pintura, colagem, teatro, dança, música, escultura, mímica e outras, com seus
variados estilos, materiais e técnicas;
-Pesquisar
e selecionar livros de literatura infantil que auxiliem o desenvolvimento do
trabalho, assim como outras fontes: CDs, livros de arte, gravuras, músicas,
vídeos, textos etc);
-Discutir,
criar e programar as atividades com alunos;
-Visitar
exposições de arte e de livros.
O TRABALHO COM OS ALUNOS
-Conhecer
a diversidade de títulos do acervo da biblioteca, de acordo com os temas
trabalhados e pela livre escolha;
-Conhecer,
apreciar e trocar impressões sobre as diversas formas de expressão artística
(desenho, pintura, colagem, teatro, dança, música, escultura, mímica);
-Conhecer,
através de livros, os artistas selecionados e suas obras, de acordo com os
temas do Projeto Pedagógico;
-Valorizar
suas próprias produções;
-Experimentar
as formas de expressão selecionadas, com seus variados estilos, materiais e
técnicas.
IV- DESENVOLVIMENTO DAS AÇÕES
No inicio, enquanto esperava aprovação por parte da
Secretaria de Educação para o início das reuniões com as educadoras,
providenciei, através de cópias xerocopiadas, gravuras dos pintores,
relacionados na Coleção “Crianças Famosas” da Editora Callis, e confeccionei,
inicialmente sozinha, painéis com essas gravuras. Com a ajuda de um estúdio,
montei e reproduzi dois CDs com duas músicas de cada compositores, também
abordados na mesma coleção. O restante dos livros da coleção foi adquirida pela
escola juntamente com as coleções “Artistas Famosos”, “Artistas Brasileiros”,
da mesma editora, e outros livros que fundamentam o trabalho. O acervo de
literatura infantil, que já dava suporte aos temas trabalhados também continua
a ser ampliado anualmente.
É nos encontros semanais que acontece todo o trabalho de
estudo, conhecimento de obras e artistas, ampliação de leituras de livros,
revistas e jornais sobre cultura, realização de atividades práticas com música
e vídeo, discussões, trocas de experiências, etc.
De acordo com as atividades elaboradas e/ou sugeridas, é
necessário providenciar a aquisição de materiais ao longo do trabalho (papéis,
tintas, argila, diversos materiais que podem servir de suporte, etc)
Os livros de literatura infantil e/ou biográficos
pertencentes ao acervo da Biblioteca da Escola norteiam o contato com as obras
artísticas e apóiam os trabalhos de discussão e elaboração de atividades,
integrando literatura e arte-educação aos conteúdos do planejamento anual, que
distribui os temas a serem trabalhados por bimestre, numa seqüência que busca
interligar um tema ao outro. A atividades básicas do trabalho são: leitura de livros de acordo com os
temas trabalhados, utilização de músicas e gravuras de artistas, articulados
aos temas, leitura das histórias biográficas dos artistas, troca de impressões
e experiências pessoais, apreciação das obras (musicais ou plásticas), criação
e/ou releitura através de atividade prática (diversas expressões), localização
geográfica dos países de origem dos artistas no globo terrestre, assim como os
aspectos referentes ao contexto em que viveram, observação de paisagens,
desenho e pintura, canto, dança, dramatização, recitação, exploração dos
instrumentos da Banda Rítmica da escola, criação de histórias a partir de
imagem, etc. A seqüência e quantidade de atividades a serem desenvolvidas não
são fixas, por serem planejadas de acordo com os objetivos estabelecidos para o
tema trabalhado e por cada uma das educadoras.
V- UMA PALAVRA SOBRE OS RESULTADOS
Em relação ao meu trabalho em sala
de aula, que já acontecia baseado em bons livros, percebi que a arte-educação
foi incorporada de forma a substituir os modelos prontos, desenvolvendo
atividades que motivam a sua realização. Todos os temas que trabalhamos podem
ser desenvolvidos com arte, proporcionando momentos de criatividade, imaginação
e prazer.
Em relação às educadoras, houve crescimento do entusiasmo e
da confiança de cada uma no trabalho com a arte, de forma gradual, além da ação
com o livro, que já fazia parte da sala de aula, no desenvolvimento do
planejamento. No início, tudo era muito novo: o desconhecimento das obras,
compositores e pintores, e as dúvidas em relação à dinâmica do trabalho eram
grandes. Isso se deve, em parte, ao fato de a maioria não freqüentar eventos
artísticos (exposições, apresentações de música, teatro e dança, etc). Aos
poucos, conforme as reuniões semanais foram acontecendo, com estudos, trocas de
experiências, dinâmicas, observações de gravuras, audição de músicas, etc, as
educadoras começaram a se sentir mais seguras para experimentar, apesar de
ainda estarem bastante dependentes das discussões e incentivos do próprio
grupo.
O
interesse dos alunos pelos conteúdos programados, a partir do trabalho
integrado entre literatura infantil e arte, tem crescido sensivelmente, pois
além dos temas se relacionarem com suas experiências e conhecimentos trazidos
para a escola, as crianças sentem imenso prazer em ouvir histórias, cantar,
dançar, desenhar, pintar, modelar, sujar as mãos com tinta e argila e ouvir
música; conseqüentemente, as atividades se tornam significativas. Pedem para
colocar a música trabalhada novamente no dia seguinte, para ouvir, para dançar,
assim como solicitam a leitura dos livros de literatura. Sentem prazer em
observar as gravuras e em mostrar seus trabalhos aos colegas, pois estão
valorizando mais suas produções e as dos outros. Todos os dias me perguntam
quando levarão seus trabalhos para casa. Outro ponto interessante que tenho
observado é o crescimento no desenvolvimento do desenho, com aperfeiçoamento
dos traços e maior cuidado na elaboração e cuidado com o material.
IV- BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Ministério
da Educação Fundamental.
Referência
curricular para
a educação infantil/Ministério da
Educação
fundamental.- Brasília: MEC/SEF,
2001.
BATTISTONI Filho, Duílio.
Pequena História da Arte.
Campinas:
Papirus, 1991.
ROSA, Nereide S. Santa. Tarsila do
Amaral. São Paulo: Callis,
1998.
VON, Cristina.
As Mil Cores. São Paulo: Callis, 2002.
FORSLIND, Ann.
Cores: Jogos e
Experiências. São Paulo: Callis,
1996.
FORSLIND, Ann. Pinturas: Jogos e Experiências.
São Paulo: Callis,
1997.
MOULIN, Nilson e Matuck, Rubens.
Portinari: “Vou pintar aquela
gente...”.
São Paulo: Callis, 1997.
GRIMSHAW, Caroline.
Arte: Conexões! São Paulo: Callis,
1998.
GRIMSHAW , Caroline.
Música: Conexões! São Paulo: Callis,
1999.
Coleção Gênios da Pintura.
Editor Victor Civita. Abril Cultural.
Coleção Viajando através da
História. Editora Scipione.
MARIA LÚCIA BACHIEGA KOLOKATHIS
2004
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